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Saiba um pouco sobre victoria francés nossa linda artista....

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010.
Victoria Francés (Valencia, 25 de Outubro de 1982) é uma pintora e ilustradora espanhola, licenciada em Belas Artes na faculdade de San Carlos de Valencia.
Desempenha o seu papel de ilustradora realizando diversos trabalhos em capas de livros e obras por encargo. Desde criança que acha fascinante a beleza dos bosques galegos, onde passou grande parte da sua infância. Após ter viajado a cidades como Londres e Paris, ficou hipnotizada pelos ambientes que deram vida a obras literárias e legendárias do género gótico. As suas ilustrações e desenhos representam assim um mundo onírico do romantismo gótico. Inspirada pelo género das pinturas prerrafaelitas, apresenta temáticas que nos levam a um mundo simbologista, mágico e ancestral.
Todo o sofrimento dos seres proscritos deste mundo é retratado em forma de castelos obscuros e manções de luzes tremeluzentes, onde se reconhece a influência de Goethe, Edgar Allan Poe, Baudelaire e inclusivé Bram Stoker.
Bibliografia
  • Favole 1. Lágrimas de pedra
  • Favole 2. Liberta-me
  • Angel Wings
  • Favole 3. Luz Gélida
  • El Corazón de Arlene
  • Misty Circus vol.1

 

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Vampiros reais...Alguns depoimentos...

Começo com o depoimento de A.J., uma paulista com cerca de 30 anos.

Não sei se isso é genético, mas posso dizer que essa "particularidade" está presente na minha vida desde que me entendo por gente e, recentemente, "acordei" para isso (...). Comigo, tudo começou com o meu interesse a respeito do assunto. Eu, na época uma garota sem o menor discernimento, lia um monte de abobrinhas e não sabia no que confiar. Aos poucos, iniciei um projeto de auto-conhecimento extremamente traumático. Voltar-se a si e surpreender-se com a descoberta sempre machuca. Comecei a ter muitos sonhos estranhos e sabia que deveria prosseguir. Consegui manter a cabeça no lugar e perdi um pouco o medo do que estava por vir.

Comecei a conversar com algumas pessoas que eram como eu. Conheci algumas pessoalmente, mas eu ainda tinha medo de perder o controle. Era estranho pensar que, de repente, enxerguei-me como algo comumente desacreditado, apesar de as coisas que aconteciam comigo serem bem diferentes do que é narrado na ficção (...). Minha aceitação demorou bastante, e isso faz muito tempo (...).

Demorou, mas com o tempo aprendi a ser calma e a entender melhor o que é a "fome". Eu acordo, trabalho, volto para casa, durmo, e ela continua sempre lá, escondida dentro de mim, esperando a hora certa de se insurgir. Eu particularmente nunca precisei de muito sangue, minha necessidade é moderada. Aceitar a fome é torná-la menos assustadora. Aos poucos você aprende a controlá-la, como num regime.

Normalmente ela vem acompanhada de enxaquecas e mau humor. Neste caso, ocupo-me de algo que desvie minha atenção, pois assim não dou muita bola para os sintomas. Antigamente, queria viver sem isto, ser uma pessoa "normal". Eu me sentia mal de pensar que estaria me alimentando de alguém, mas hoje eu aceito sangue como quem aceita presentes. Prefiro, é claro, praticar isto com alguém que seja como eu, para que possamos doar um ao outro. Além de ser mais íntimo, é bem mais seguro.

Não gosto de variar doadores. Tenho um parceiro fixo com quem pratico isto. Não posso subestimar as muitas doenças transmissíveis; ainda que ingerir sangue represente o mesmo risco que sexo oral, nunca se sabe quando é que tiraremos a "sorte grande". Quando você toma sangue de alguém, você não está simplesmente bebendo um líquido vermelho e quente. Você está entrando em contato com a energia daquela pessoa e, bem ou mal, ela passa a viver dentro de você. Não quero este tipo de contato com estranhos; sou um tanto territorial.

Infelizmente, não vivemos num mar de rosas. Quando se fica com fome, seus sentidos ficam mais aguçados, barulhos altos irritam, o sol incomoda mais e você invariavelmente enxerga pessoas como frangos assados. Se fico muito tempo sem me valer de meu doador, fico tonta, tenho calafrios e sinto um grande vazio na barriga. A temperatura de meu corpo cai um pouco, minha pele fica mais gelada e fico muito irritada. Mas passa.

Não sei se conseguirei explicar o que acontece comigo quando ingiro sangue. Geralmente eu não necessito de muito para me satisfazer. Alguns mililitros já são suficientes. A sensação é muito reconfortante, um calor na garganta e na barriga, como se ele estivesse sendo absorvido assim que tomado. Sinto um grande bem-estar, acompanhado duma leveza e duma leve vertigem. Nunca me senti enjoada ou com ânsia nessas ocasiões. Muitas pessoas dizem que sangue não pode ser digerido, mas ele pode. Se você tomar muito e não estiver acostumado, vai se sentir mal e pode até vomitar; mas, feito da forma certa, isso não acontece.

(...)

O que sei é que faço isso e não me envergonho. Muitas vezes, esqueço-me destes detalhes do meu cotidiano, mas duma forma ou de outra eles acabam me mandando um recadinho. Não me alimento de sangue há muito tempo, estou numa espécie de abstinência voluntária. Ultimamente, não tenho condições de dar muita atenção a este aspecto de minha vida que anda dormente, esperando um pouquinho de calma para poder voltar a me incomodar. Tenho pontos de vista que podem ser considerados "anormais" pela sociedade, mas não sou nenhuma psicopata. Respeito muito as pessoas ao meu redor, e, da mesma forma, exijo respeito. E assim, cautelosamente, continuo vivendo.

(Publicado em “Laços Sanguíneos: A Atual Subcultura Vampírica”, de José Octavio Stevaux Galvão. In: Cid Vale Ferreira, org., Voivode. Estudos sobre os Vampiros. Jundiaí: Pandemonium, 2002, p. 111-113.)

Li esse depoimento em Voivode, uma coletânea de textos sobre vampiros, que reúne desde alguns documentos clássicos sobre o assunto, publicados no século XVIII, até uma análise sobre a voga vampírica entre os jovens de hoje, que nasce como uma ramificação dos movimentos gótico e dark na cultura do rock. Minha intenção inicial era desenvolver um pouco mais os argumentos que apresentei num artigo sobre Voivode, publicado no jornal Folha de S.Paulo, onde sou colaborador. Não imaginava a quantidade e a variedade dos estudos, de enfoque psicanalítico ou quase, que já foram publicados a respeito de vampiros e vampirismo; limito-me, usufruindo de um pouco mais de espaço do que aquele a que estou confinado nas páginas do jornal, a algumas perambulações em torno do assunto.

No depoimento de A.J., algumas coisas me chamaram a atenção. A sua descrição do "vampirismo real" apresenta óbvias semelhanças com as descrições que já conhecemos a respeito de outros tipos de comportamento, de queixa, de sintoma ou de descoberta interior. Várias passagens do texto – "não sei se é genético"... "aos poucos 'acordei' para isso"... "comecei a conversar com pessoas que eram como eu..." etc. – e o final – "não me envergonho do que faço... exijo respeito..." – poderiam, sem maiores adaptações, constar do depoimento de alguém que estivesse narrando o modo como se descobriu homossexual. As cautelas em torno de doenças sexualmente transmissíveis, a importância de evitar promiscuidade, de preferir um só "doador" de sangue, também vão nessa direção. Podemos ver, aliás, em sites especializados em vampirismo real – como o http://www.sanguinarius.org – que o vocabulário do grupo faz diversas menções, quando não os traduz diretamente, aos termos da cultura gay. Fala-se em "sair do caixão", como entre os gays "sair do armário", por exemplo; e embora o vampirismo real não pressuponha nenhuma relação sexual entre parceiros, o conjunto das práticas em que isto ocorre é chamado pela comunidade, num trocadilho irresistível, de "hemossexualidade".

Ao mesmo tempo, a descrição de A.J. se assemelha, em alguns momentos, à queixa de alguém que sofresse com a dependência química. Não apenas a ingestão de sangue lhe assegura momentos de "leveza e bem-estar", como também a abstinência prolongada – a "fome", segundo a terminologia do grupo – traz consigo irritabilidade, tontura, calafrios... Em outros relatos, resumidos no site acima citado, há o risco de que a fome ("the hunger") determine a eclosão da "besta" ("the beast"), que é como a comunidade descreve a propensão ao comportamento descontrolado, violento e mesmo criminoso: a forma, digamos, não-consensual do vampirismo. A semelhança da ingestão de sangue com a de drogas é, certamente, um tópico freqüente na literatura sobre vampiros. Situando-se em algum ponto entre a drogadição, os distúrbios alimentares, a tensão pré-menstrual e a preferência sexual não-ortodoxa, é como se ao comportamento de A.J. não correspondesse um discurso específico, identificável como tipicamente vampiresco. Uma passagem rápida pelos depoimentos registrados no sítio supracitado parece nos indicar a repetição das mesmas sensações, semelhantes a sintomas de uma doença física – hipótese que deveria, sem dúvida, ser levada em conta – mas indicadoras, sobretudo, da ausência de uma linguagem própria: é como se o seu discurso "vampirizasse" a fala de outras "minorias" e a descrição de outras sensações. É verdade que, num trecho do depoimento de A.J., ela declara: "pessoas como eu, não vou mentir, gostam bastante de morder", acrescentando "vai ver que não temos a fase oral muito desenvolvida". Mas em geral é mais prático, afirma, usar bisturis, seringas, artefatos para recolhimento de amostras de sangue. De modo que é apenas nesta curta menção ao "morder", logo reprimida por uma explicação psicanalítica, que algo específico do vampirismo poderia ser imaginado. Prazer despertado pelo pescoço, tipos de veias, sensação de dentes, nada disso parece estar necessariamente envolvido no caso, ou então trata-se de preferências que ainda não encontraram quem descrevesse em detalhe.

O discurso "vampirizado" – via apropriação do vocabulário gay ou da descrição da sintomatologia dos dependentes químicos – não necessariamente nos deve sugerir conclusões acerca da insinceridade, é claro, das pessoas que o proferem. Ao contrário, é um problema para o qual eu gostaria de apontar algumas idéias no final deste texto.

Antes disso, gostaria de indicar, para fins de contraste e aproximação, dois outros momentos do "vampirismo", duas outras "versões" anteriores da existência do vampiro enquanto fenômeno cultural, que precedem a atual voga entre os jovens.

Os relatos sobre aparição de vampiros em regiões da Sérvia, da Polônia e da Hungria, que se tornaram comuns na primeira metade do século XVIII, estão longe de apresentar pontos em comum com a imagem de sedução sexual e de elegância aristocrática que associamos à legenda atualmente. Estão muito mais relacionados com alimentação do que com sexo, com fome do que com sedução, com pobreza do que com sangue azul. Camponeses mortos subitamente voltam à casa de seus familiares, na hora do almoço por exemplo; atacam crianças ou adultos; seus cadáveres, uma vez exumados, mostram impressionantes sinais de vitalidade. Uma velhota ressequida e magra é encontrada gorda e corada em seu túmulo; os vampiros tendiam a comer as próprias vestes e a terra que os cobria, sendo uma das estratégias para combatê-los enterrar as pessoas com uma pedra na boca, funcionando como um tampão. No limite, o vampiro se perverteria em canibal. Sua terapia, como sabemos, é a exumação e destruição do cadáver, num segundo rito fúnebre.


Casal fotografado por Danielle Bedics
O século XIX é que sexualiza, por assim dizer, o vampiro – passo ao largo, aqui, das conhecidas relações entre romantismo e morte, assim como do bastante explorado paralelo entre a condição parasitária do vampiro e sua extração oligárquica. As leituras e interpretações dos clássicos da literatura sobre vampiros, como Drácula, de Bram Stoker, aliás me levaram a encarar com crescente modéstia esta comunicação. Há verdadeiros prodígios de engenhosidade crítica nos estudos que li a respeito, em geral inspirados pela escola dos "estudos culturais" americana. De Foucault a Marx, passando por Freud e pela teoria feminista, há possibilidades de ver em Drácula uma denúncia do imperialismo britânico e sua defesa, uma sutil apologia do homossexualismo masculino e uma reacionária repressão do mesmo; observo tudo isso sem ironia, porque de fato são extremamente convincentes a maior parte dos trabalhos que li.

Julguei possível, mas não neste curto espaço, avançar uma interpretação alternativa do romance: basta-me indicar que, na visita do protagonista Jonathan Harker ao castelo de Drácula, na primeira e melhor parte do livro, é da aventura de um rapaz casadoiro, de um profissional recém-chegado à vida adulta, que se trata. Não estando diretamente colocada a condição do adolescente no final do século XIX, chamo a atenção para o fato de que Harker é um jovem que se inicia nos mistérios da vida profissional e que está adiando, para o casamento, a consecução de seus desejos sexuais. Poderíamos dizer que, na figura do conde, Harker não enxerga nada mais do que a si próprio – atribuindo a outro os desejos dessa "besta" que irá desvirginar, numa noite de sangue, sua noiva. É essa situação "pré-adulta" do personagem que explica, a meu ver, a conhecida cena em que Harker, cortando-se enquanto se barbeia em presença do conde, só vê a si próprio no reflexo do espelho . É como se ficasse indicado que só ele estava no castelo; que Drácula apenas era projeção de seu desejo – como o será, mais tarde, com relação a todos os outros "homens de bem" reunidos em torno do especialista Van Helsing. Minha impressão, lendo o romance, é que sempre que estes manifestam inclinação pelas jovens personagens femininas do romance, é como se fosse dada a senha para um novo ataque de Drácula... Se aqui o paradigma é do desejo masculino recalcado (e, note-se, horrível, nojento, rastejante, pois o conde nada tinha de galã no romance de Stoker) não é de estranhar que ao longo do século XX, à medida que o sexo vai deixando de ser tabu, Drácula se torna mais e mais atraente e simpático, cabendo a seus adversários, mais e mais, o papel de vilões perversos do drama: estaqueadores de mulheres, fetichistas da transfusão de sangue, puritanos deslocados, cabe aos caça-vampiros o papel de inimigos do sexo romântico e dos agora lícitos frenesis da carne exposta.

Passamos resumidamente, assim, de um paradigma em que o vampiro vinha a ser como que a encarnação da fome, para outro, em que estava em jogo o desejo sexual; de um paradigma em que a forma da narrativa do caso vampiresco era a lenda/o relatório policial, no século XVIII, para outro, em que a forma é a ficção – romanesca ou cinematográfica.

Na cultura do vampirismo atual, parece estar em jogo um terceiro paradigma, em que a lenda e ficção foram substituídas, na melhor das hipóteses, pela prática dos "role playing games"; mais provavelmente, caberia dizer que a ficção cede lugar a uma espécie de auto-ficcionalização, ou de encenação prática, no mundo real: a pessoa se acredita vampira e leva uma vida condizente com isso. A que novo impulso isso estaria respondendo? Não posso mais do que sugerir uma rápida hipótese. Em vez de fome ou desejo sexual, penso que se trata agora de uma necessidade de reconhecimento. É como se nos dias de hoje, fosse o próprio Harker o personagem incapaz de ter reflexo no espelho; precisa de um papel, precisa tornar-se um Drácula, por exemplo, para encontrar sua identidade. Nesse caso, qualquer identidade parece servir: fico pensando se determinadas perversões, hoje celebradas à luz do dia, não se tornaram antes estratégias de identidade e diferenciação, estratégias de visibilidade e de convívio em grupo, mais do que respostas à particularidade do desenvolvimento sexual de cada um. Uma espécie de "pseudo-perversão" inócua seria a marca da sexualidade não mais reprimida, não mais secreta, da nossa situação pós-moderna. De alguma forma, trata-se de escavar mais fundo, em busca de segredos mais sombrios que os do desejo sexual, do homoerotismo ou do sadomasoquismo...


Vampirista moderna em Londres
No caso do vampirismo real, termino com uma sugestão ainda um pouco mais arriscada – porque se trata de transpassar o umbral da teoria psicanalítica propriamente dita – inspirando-me nas idéias de Nicolas Abraham e Maria Torok a respeito da "incorporação" do objeto perdido numa "cripta intrapsíquica". Incapaz de passar pelo processo de luto, porque seu amor pelo objeto perdido era inconfessável, o sujeito "engole" e "preserva", intacto e vivo, o ser amado numa cripta:

A incorporação resulta daquelas perdas que por alguma razão não podem ser reconhecidas como tais. Nesses casos especiais a impossibilidade de introjeção é tão profunda que mesmo nossa recusa a vivenciar o processo de luto está proibida de receber uma linguagem, de modo que estamos impedidos de oferecer qualquer indicação de que estamos inconsoláveis. Sem a válvula de escape de algo que comunicasse nossa recusa de viver o luto, somos reduzidos a uma negação radical da perda, fingindo que não havia absolutamente nada a perder. As palavras que não podem ser pronunciadas, as cenas que não podem ser rememoradas, as lágrimas que não podem ser derramadas – tudo terá de ser engolido juntamente com o trauma que levou à perda. Engolido e preservado. O luto inexprimível erige uma tumba secreta dentro do sujeito. Reconstituído a partir das memórias de palavras, cenas, e afetos, o correlativo objetal da perda é enterrado vivo na cripta como uma pessoa perfeitamente desenvolvida, completa, com sua própria topografia. (...) Um mundo inteiro de fantasia inconsciente é criado, levando sua existência separada e escondida. Algumas vezes, nas altas horas da noite (...) o fantasma da cripta volta para assombrar o guarda do cemitério, transmitindo-lhe estranhos e incompreensíveis sinais, fazendo-o desempenhar atos bizarros, ou sujeitando-o a sensações inesperadas.

("Mourning or Melancholia", in The Shell and the Kernel. Editado e traduzido por Nicolas Rand. Chicago e Londres: The University of Chicago Press, 1994, vol. 1, p. 130.)

É como se o vampirismo real se encarregasse, por seu turno, de explicitar sem grande surpresa as entrelinhas desse texto de Abraham e Torok. O vampiro – que era uma metáfora mais ou menos implícita (encriptada?) nesse artigo – vem à tona nos relatos como de A.J. e nos sites de vampirismo real. Minha sugestão é que isso se torna possível no caso de "vampiros reais" como A.J. porque aquela cripta, onde deveria estar preservado o objeto perdido, estava na verdade vazia. A vontade de ser vampiro é de preenchê-la, é de tornar-se a si mesmo um cadáver incorruptível, ou de criar um outro para consumo próprio... O objeto que se perdeu não é ninguém menos do que o próprio sujeito: e por isso A.J. dirá que, ao fim de um processo traumático de auto-conhecimento, "voltou-se para si mesma"... mas no sangue de outra pessoa é que se encontra alguém que "passa a viver dentro de você". Torna-se vampiro real, talvez, quem se defronta, ao abrir a cripta, não com o objeto perdido, mas com sua própria inexistência.

A "morte do sujeito" e as questões da "identidade" são, claro, temas bastante recorrentes nas discussões sobre o pós-moderno. Seria temerário prosseguir. Muitos dos riscos que assumi ao escrever este texto estarão, a esta altura, bastante claros para o leitor. Acrescento mais um, talvez o maior deles: o de encarar como "caso", a ser bem ou mal analisado, um comportamento que não necessariamente se coloca como problema ou como queixa para os que o adotam; e, para psicanalistas ou curiosos como eu, talvez também valha a antiga regra, de só aparecer quando convidado.
Conexão Inválida
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Mais sobre o vampirismo


A crença em vampiros nasceu milênios de anos atrás, quando o homem descobriu que o sangue é a fonte da vida, e se espalhou pelo mundo todo. Em muitos lugares, como na Romênia - pátria de Drácula -, ela sobrevive ainda hoje.

O significado do vampirismo perde-se muito longe no passado, desde que o caçador primitivo descobriu que, Juntamente com o sangue que sai de um animal, ou de um outro homem, a vida também escapa e se extingue. O sangue é a fonte da vitalidade. Por isso, os homens se besuntaram a si mesmos de sangue, e às vezes o beberam. Foi assim que a idéia de beber sangue para renovar a vitalidade entrou na historia. Para o vampiro, na verdade, "o sangue é a vida" – como citou Drácula, e ainda em Deuteronômio 12:36, embora a passagem bíblica real seja uma advertência contra beber sangue. ("Tão somente o sangue não comereis; sobre a terra derramarei como água") Outra passagem da Biblia onde cita a advertência esta em Gêneses 9:4 ("A carne porem, com sua vida, isto é com seu sangue, não comeris")

A crença em vampiros é universal. Ela é documentada na antiga Babilônia, no Egito, em Roma, na Grécia e na China. Os relatos sobre vampiros existem em civilizações completamente separadas, entre as quais, quais quer influências diretas foram impossíveis. O vampiro é conhecido por vários nomes - vrykolakes, brykilakas, barbarlakos, borborlakos ou bourdoulakos em grego moderno; katakhanoso ou baital em sânscrito antigo: upiry em russo; upiory em polonês; blutsäuger em alemão; etc. Os chineses antigos temiam o giang shi, um demônio que bebia sangue. Na China, os vampiros já existiam em 600 a.C. Descrições de vampiros são encontradas nas antigas cerâmicas da Babilônia e da Assíria, milhares de anos antes de Cristo.
A crença também floresceu no Novo Mundo, assim como no Antigo. Os peruanos pré-colombianos acreditavam numa classe de demônios chamados canchus ou pumapmicuc, os quais sugavam o sangue dos jovens adormecidos de modo a partilhar sua vida. Os astecas sacrificavam o coração dos prisioneiros ao sol, na crença de que seu sangue conservava a energia solar.

No começo da era cristã, o erudito Bhavabhuti escreveu contos clássicos indianos, inclusive 25 histórias de um vampiro que animava cadáveres e podia ser visto pendurado de cabeça para baixo numa árvore, como um morcego. O deus hindu Shiva partilha muitas semelhanças com os vampiros, tal como ser capaz de criar e de destruir ao mesmo tempo. A idéia de vampiro supõe o conceito oriental do eterno retorno, segundo o qual ninguém é realmente destruído, mas volta vezes sem fim em reencarnações.

Os vampiros tiram o sangue dos viventes, mas se misturam o seu sangue ao de sua vítima essa pessoa setorna um morto-vivo, sobrevivendo à morte comum. A prova de que os vampiros foram considerados essencialmente femininos, sem órgãos masculinos, vem de Santo Agostinho e dos primeiros padres da Igreja. Agostinho escreveu que os demônios tinham" imortalidade corporal e paixões como seres humanos", mas não podiam produzir sêmen. Em vez disso, eles juntavam sêmens dos corpos de homens reais e os injetavam em mulheres adormecidas para engravidá-las. São Clemente testemunha que os demônios têm paixões humanas mas "não órgãos, assim eles se voltam para os humanos para usar seus órgãos. Uma vez exercendo o controle desses órgãos, podem obter o que querem".

Durante o século 18, um vampiro famoso chamado Peter Poglojowitz surgiu em uma pequena aldeia da Hungria. Após sua morte, em 1725, seu corpo foi desenterrado. Encon traram sangue fresco escorrendo de sua boca e seu corpo não aparentava os sinais de rigor mortis ou de decomposição. Assim, os camponeses locais imaginaram que se tratava de um vampiro e queimaram o corpo.

Os ortodoxos cristãos que em 1725, seu corpo foi desenterrado.

Em 1732, o caso do vampiro sérvio Arnold Paole, de Medvegia, estimulou a pesquisa científica do século 18 sobre vampiros. Em pleno ápice do racionalismo, em 1751, um erudito dominicano, Augustin Calmet, escreveu um tratado sobre vampiros na Hungria e na Morávia. As crenças em vampiros são particularmente fortes hoje no sudeste da Europa, especialmente entre os modernos gregos. A ilha sulina das Cíclades, em Santorini, é considerada maldita pelos vampiros que tem.

Muitos autores notaram esse fenômeno desde o século XVII. De fato, se um vampiro suspeito era descoberto na Grécia continental, embarcavam seu corpo em navio para Santorini, porque o povo lá tinha uma longa tradição e uma vasta experiência a respeito de vampiros. Um velho dito grego fala em "trazer vampiros para Santorini".

As práticas ortodoxas de excomunhão reforçam a crença nos vampiros. Quando os padres ou bispos ortodoxos cristãos expedem uma ordem de excomunhão, acrescentam a maldição "e a terra não receberá seu corpo" Isso significa que o corpo da pessoa excomungada permanecerá "incorrupto e inteiro". A alma não descansará em paz. Nesse caso, a não-decomposição do corpo é um aviso do mal. Os ortodoxos cristãos que se couverteram ao catolicismo romano ou ao islamismo são condenados a vagar pela terra e a não entrar no céu. É importante lembrar nesse contexto que o Drácula histórico, tendo se convertido ao catolicismo próximo ao fim de sua vida, "abandonou a luz da ortodoxia" e "aceitou a escuridão" da heresia, e a partir daí candidatou-se a se tornar um morto-vivo, um vampiro.

Os romenos em particular têm muitos nomes para uma grande variedade de vampiros. Por exemplo, o termo mais comum, strigoi (na sua forma feminina é strigoaica), é uma criatura demoníaca que dorme durante as horas do dia, voa à noite e pode tomar a forma animal de um lobo, um cão ou um pássaro, e chupa o sangue de crianças adormecidas. A fêmea é mais perigosa que o macho. Ela pode também destruir casamentos e colheitas, impedir vacas de darem leite e mesmo provocar doenças fatais e a morte. O pricolici romeno é um vampiro que pode aparecer nas formas humana, de cachorro e de lobo. Entre os romenos, os vampiros são sempre o mal, sua jornada para o outro mundo foi interrompida e eles são condenados a vagar entre os vivos por um tempo.

Na Transilvânia, o alho é a arma poderosa para deter vampiros. As janelas e as portas são ungidas com alho para mantê-los a distância. Além disso, animais de criação, especialmente ovelhas, são esfregados com alho, pois os vampiros podem atacá-los as sim como fazem com os humanos.

Os camponeses consideram o alho uma planta medicinal. Eles o comem para curar o resfriado comum e várias enfermidades. Tudo que afasta as doenças é considerado bom ou magia "branca", de onde se conclui que o alho pode afugentar os demônios, o lobisomem e os vampiros.

A tumba de um vampiro pode ser identificada por buracos em torno do sepulcro bastante grandes para que uma serpente possa passar por eles. Para impedir que o vampiro saia de sua sepultura, esses buracos devem ser enchidos com água. Os espinhos das rosas selvagens são garantidos para manter vampiros a distância. Sementes de papoula são espalhadas no caminho do cemitério para a cidade porque os vampiros são contadores compulsivos e não conseguem deixar de querer catá-las. Essa prática pode impedir o vampiro de chegar à aldeia antes do raiar do dia, hora em que ele deve voltar ao seu caixão.

O modo definitivo de destruir um vampiro é dirigir ao seu coração uma estaca que deve atravessá-lo, ou ao seu umbigo, enquanto é dia claro e o vampiro precisa repousar no caixão. A estaca deve ser feita de oliveira ou de álamo. Em algumas regiões da Transilvânia, barras de ferro de preferência aquecidas ao rubro - são usadas. Como garantia adicional, o corpo do vampiro é queimado. Às vezes um abeto é enterrado no corpo do vampiro para mantê-lo na sua sepultura. Uma derivação disso é o pé de abeto como ornamento, encontrado hoje sobre os túmulos na Romênia.

Muitos romenos acreditam que a vida após a morte será bastante parecida com a vida na Terra. Como não há muita fé num mundo puramente espiritual, parece razoável que após a morte o vampiro possa andar pela Terra do mesmo modo que uma pessoa viva. Os mortos ambulantes não são sempre vampiros, no entanto. De fato, o termo romeno para morto-vivo, moroi, é mais comum do que o termo para vampiro ou sugador de sangue, strigoi, mas ambos são mortos do mesmo modo. Os strigois são literalmente pássaros demoníacos da noite; eles só voam após o pôr-do-sol, comem carne humana e bebem sangue.

A crença em mortos ambulantes e vampiros bebedores de sangue talvez nunca desapareça. Foi só no século passado 1823, para ser exato , que a Inglaterra pôs fora da lei a prática de enterrar estacas no coração dos suicidas. Hoje é na Transilvânia que a lenda dos vampiros tem seu apelo mais forte.

Na Europa Oriental diz-se que os vampiros têm dois corações ou duas almas. Uma vez que um desses corações ou uma dessas almas nunca morre, o vampiro permanece um morto-vivo.

Quem pode tornar-se um vampiro? Na Transilvânia, criminosos, bastardos, feiticeiras, mágicos, pessoas excomungadas, os que nascem com dentes, com âmnio (ou membrana na cabeça) e crianças não batizadas podem tornar-se vampiros. O sétimo filho de um sétimo filho está condenado a se tornar vampiro.

Como se pode descobrir um vampiro? Toda pessoa que não come alho ou que manifesta uma clara aversão ao alho é suspeita.

Os vampiros às vezes atacam os mudos. Podem roubar a beleza ou a energia de alguém, ou ainda leite de mães que amamentam.

Na Romênia, os camponeses acreditam que os vampiros e outros espectros encontram-se na véspera do dia de Santo André, num lugar onde o cuco não canta e o cachorro não ladra.

Os vampiros têm medo da luz, e por isso é necessário fazer um bom fogo para afastálos, assim como tochas devem iluminar o exterior das casas.

Mesmo se você se tranca na sua casa, não está a salvo dos vampiros, uma vez que eles podem entrar pelas chaminés e pelo buraco da fechadura. Assim, deve-se esfregar a chaminé e as fechaduras com alho, assim como as janelas e portas. Os animais de criação devem ser também esfregados com alho para sua proteção.

Cruzes feitas de espinhos de rosas selvagens são eficazes para manter longe os vampiros.

Os corpos são exumados entre três e sete anos após o sepultamento; se a decomposição não é completa, uma estaca deve ser cravada no coração.

Se um gato ou outro animal demoníaco salta ou voa sobre o corpo antes que ele seja enterrado, ou se a sombra de um homem passa sobre o cadáver, o falecido pode ser um vampiro.

Se o corpo do morto é refletido no espelho, o reflexo ajuda o espírito a deixar esse corpo e a se tornar um vampiro.

No folclore húngaro, uma das maneiras mais comuns de identificar um vampiro era escolher uma criança jovem bastante para ser virgem e sentá-la num cavalo de cor homogênea que também fosse virgem e nunca tivesse tropeçado. O cavalo era levado ao cemitério e solto entre as sepulturas. Se ele se recusasse a passar sobre um túmulo, ali poderia estar um vampiro.

É comum o túmulo de um vampiro ter um ou mais buracos pelos quais possa passar uma serpente.

Como matar um vampiro? A estaca, feita de uma roseira selvagem, álamo ou abeto, ou de ferro em brasa, deve ser dirigida para o coração do vampiro, a fim de mantê-lo preso no seu túmulo. 0 corpo do vampiro será então queimado, ou enterrado novamente numa encruzilhada.

Se um vampiro não é encontrado ou é considerado inofensivo, ele primeiro matará todos os membros mais próximos da sua família. Depois se voltará para os outros habitantes da aldeia e os animais.

O vampiro não pode se distanciar de sua sepultura, uma vez que deve retornar para ela antes do raiar do dia.

Se não for localizado, o vampiro pode subir ao campanário de uma igreja e recitar ali os nomes dos habitantes do lugar, que morrerão instantaneamente, ou em algumas regiões o vampiro tocará um dobre de finados e todos que o ouvirem morrerão na hora.

Se o vampiro continua despercebido por sete anos, pode viajar para outro país ou a um lugar onde outra língua é falada e tornarse humano outra vez. Ele ou ela pode se casar e ter filhos, mas todos se tornarão vampiros quando morrerem.

Os romenos cortam as solas dos pés ou amarram juntos as pernas e os joelhos dos suspeitos, para tentar impedilos de caminhar.

Alguns enterram corpos com foices em torno dos pescoços, de modo que, tentando sair, o vampiro corte fora sua própria cabeça.

Por ser uma liga pura, acredita-se que a prata tem o poder de barrar vampiros, assim como lobisomens. Por isso, as cruzes e os ícones são em geral feitos de prata.

Os camponeses do século 5 consideravam Vlad Tepes um vampiro? Quando interrogados sobre as crenças correntes, os camponeses residentes na região em torno do Castelo Drácula revelaram que há uma ligação entre Vlad Tepes e o vampiro do seu folclore. Os camponeses nada sabem do Drácula de Stoker. Os mais velhos, no entanto, acreditam piamente em vampiros e mortos-vivos.

À medida que nossa cultura se tornou mais urbana, um preconceito contra a superstição dos camponeses também cresceu. Isso é refletido no nosso uso da palavra "urbano" para descrever alguma coisa positiva, aberta e racional, e a palavra "provinciano" para designar alguma coisa primitiva, estreita e ignorante. Há uma tendência a ver a cultura camponesa como primária e não-científica. Até Karl Marx afirmou que o capitalismo pelo menos havia salvo a maioria da população da "idiotice da vida rural".

Por fim nem todas as crenças do homem moderno ocidental são lógicas e científicas. As atitudes em relação à morte e à vida foram sempre complexas para todos os homens, abrangendo ódio e amor, atração e repulsa, esperança e medo. A crença em vampiros é um modo poético e imaginativo de olhar a morte e a vida depois dela.
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