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Um curioso passeio

sábado, 6 de fevereiro de 2010.

O guia turístico anuncia:
Aqui vemos a obra Sepultamento, de Victor Brecheret, um dos artistas mais famosos do Modernismo brasileiro. Essa escultura é datada de 1923 e foi feita em granito.
Olhares curiosos e vivos reparam no ambiente ao redor. Uma criança nota os belos anjos esculpidos em bronze bem próximos a ela e estende a mão para tocá-los. Aqui surge a primeira diferença entre um museu normal e este: qualquer pessoa pode encostar nas obras ou até mesmo tirar fotos. Essa não é a única novidade, imagine ir a um museu a céu aberto! Onde existem árvores e pássaros para fazer companhia às esculturas dos mais famosos artistas dos séculos 19 e 20.
Ninguém pensaria na existência de um lugar desses em plena São Paulo. No entanto, o mais velho desses locais nasceu em 1868 e possui obras de artistas como: Galileo Emendabili, Bruno Giorgi e Nicolina Vaz de Assis. Aos curiosos, o nome de um desses maravilhosos museus: Cemitério da Consolação, o mais antigo de São Paulo.
Alguns especialistas afirmam ser o cemitério, um prolongamento da própria casa. Devido à grande miscigenação do povo brasileiro, nossos cemitérios são povoados por resquícios da cultura e arquitetura de todo o mundo. Muitos túmulos foram feitos com materiais importados, por artistas conhecidos e são hoje uma riqueza a ser prestigiada e preservada.
Entretanto, o Brasil pouco desenvolve seu turismo em cemitérios em virtude do preconceito das pessoas em relação ao local, por ser macabro, rememorar a morte e trazer sentimentos de dor, perda e saudades. Há pouca divulgação e planeja- mento de visitas orientadas ao local, em São Paulo, por exemplo, apenas o Cemitério da Consolação tem esse serviço organizado. Espaços como o Cemitério do Araçá, um dos maiores de São Paulo e com mais de 80 obras de arte catalogadas, não apresentam esse serviço. "De vez em quando vem um grupo interessando em receber informações sobre o Araçá, nesse caso nós indicamos um coveiro para mostrar as obras de arte, contar algumas histórias, nada muito formal", comenta Elias Rodolpho, Administrador do Cemitério do Araçá. "Às vezes eu levo umas pessoas para tirar fotos ou desenhar as obras de arte daqui ou mostro os mausoléus dos famosos, mas vem pouca gente, quase ninguém quer ver gente morta e túmulo", completa o coveiro do mesmo cemitério, conhecido como Massau.
Talvez se houvesse excursões a esses locais, com explicações sobre a história, arquitetura e curiosidades, os brasileiros se sentiriam mais à vontade com o assunto, pois em todo o mundo, cemitérios são, não somente pontos turísticos, mas também um local para fazer piquenique, ler ou namorar, os exemplos mais conhecidos são o Cemitério Père-Lachaise e o Montparnasse em Paris, França. "Eu gostaria de fazer uma visita monitorada a um cemitério, pois é um lugar tranqüilo e bonito, onde é possível admirar belas esculturas e mausoléus", afirma a estudante de enfermagem Andrea.
No entanto, com o aparecimento dos popularmente chamados "cemitérios-jardim", a falta de incentivo ao turismo, a constante depredação e o alto custo de materiais como o mármore e bronze; a feição de obras de arte para cemitérios e profissionais capacitados para o trabalho estão se extinguindo. Portanto, a quem pretende visitar o lugar, é melhor ser rápido, pois no futuro os cemitérios serão cada vez menos portadores de valor artístico.

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Origem dos Cemiterios


Aconteceu no mundo inteiro, um fenômeno curioso no final do século XVII. Por medida sanitária os sepultamentos passam a realizar-se em área aberta, nos chamados campos-santos ou cemitérios secularizados.
Isto já não era novidade, japoneses, chineses, judeus e outros povos já traziam tradicionalizada a inumação a "céu aberto". Os protestantes também, em muitos países o faziam. A mudança afetou principalmente os povos de predominância católica. No Brasil, o enterro fora da igreja era reservado aos não-católicos, protestantes, judeus, muçulmanos, escravos e condenados, até que por lei, inspirada na correlação que se fez entre a transmissão de doenças através dos miasmas concentrados nas naves e criptas das igrejas, se instalaram os campos de sepultamento ensolarados.
Um outro motivo, que embora não diga respeito a realidade brasileira merece ser citado, diz respeito a laicização do Estado e sua separação da Igreja. Um exemplo digno de nota é o caso do Père Lachaise de Paris, que apesar de receber o nome de um padre católico abriga tanto pessoas de várias religiões quanto não-religiosos, sendo um dos dos primeiros cemitérios laicos e também um dos mais famosos do mundo.
A urbanização acelerada e o crescimento das cidades é também uma importante razão para a criação dos cemitérios coletivos a céu aberto, visto que o crescimento populacional desenfreado não permitia mais o sepultamento em capelas e igrejas, que já não comportavam o aumento da demanda.
Numa primeira impressão o fato parece ter explicação simples, mas quando se atenta para o resultado ocorrido, sobre mais de um século, estudando-se o fantástico derrame de fortunas nas construções tumulárias pomposas, dos abastados de cada cidade, quando se verifica a diferença de comportamento entre a sepultura de igreja e a de construção livre arbitrada pela fantasia do usuário, e também quando se considera a história social e cultural do mesmo período, então se percebem outras razões no fenômeno. Não foi somente uma questão do ponto de vista higiênico, ou seja, uma razão metade prática e metade científica (e também política e social), da sociedade oitocentista. Se esta mudança acontecesse apenas por esse motivo, os cemitérios católicos em descampados teriam permanecido sóbrios e padronizados do mesmo modo que os erigidos por irmandades em mausoléus coletivos, ou como os de outras religiões.
A simplicidade dos padrões tradicionais e primitivos continuou caracterizando a sepultura coletiva enquanto o fausto e a arrogância da tumulária individual se desenvolveu espantosamente. Portanto, a verdadeira razão da grande mudança de atitude e gosto já existia há longos tempos no anseio de monumentalizar-se perante a comunidade. Era e sempre foi o desejo dos mais abastados, distinguir-se através de uma marca perene, de um objeto de consagração - o túmulo - pela atração de comparar-se aos grandes personagens da História, sem a menor cerimônia, incluindo nesta leva os soberanos, os faraós, os reis, os papas e os príncipes, que mereceram sepulcros diferenciados dos demais.
Há de fato túmulos monumentais de papas de acordo com a pompa de cada época, contudo sempre integrados à construção da igreja. Há papas que não restaram por virtudes, e sim pela eventualidade do valor artístico, ou monumental de seus túmulos. De qualquer modo, erigia-se a igreja como bem público, integrada ao uso coletivo, e nela se fazia a sepultura do seu doador e benfeitor...
Entretanto em muitas igrejas, originalmente levantadas para serem o jazigo do doador, este descansa sob uma lápide que nem perturba o nível do chão.
A arte tumulária varia com a data, acompanha cada estilo de época, e de região, e jamais sonega o caráter, a espiritualidade do meio em que ocorre. Sob tal prisma, isto é, tomando-se a arte tumulária como representativa desses atributos, podemos entender as estruturas sociais e culturais dos meios, mesmo quando tal se acha restrita a uma parcela da população. Aliás tal restrição relaciona-se diretamente com o tipo de economia da sociedade, estando deste modo a arte cemiterial condicionada a fatores de caráter sociológico, econômico e cultural.

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Arte cemiterial


Além da aparência triste e a sensação de paz presente aos cemitérios, existe também obras arquitetônicas e esculturais de valor histórico, e qualidade estética inegáveis. Nos cemitérios mais antigos, é comum encontrarmos trabalhos de artistas famosos abrigando os restos de anônimos abastados. Em alguns casos, os mausoléus são verdadeiras obras de arte alvos de visita e turismo. Os cemitérios da Recoleta em Buenos Aires, e Père Lachaise de Paris são necrópoles consideradas "pontos turísticos" por sua beleza escultural, e também pela importância dos que ali, descansam eternamente.
Em São Paulo, os cemitérios do Araçá e Consolação podem ser incluídos neste restrito grupo de "obras da arte tumular". O cemitério da Consolação abriga obras de Luigi Brizzolara e Brecheret, além das obras de outros artistas encontradas no Recife, Rio de Janeiro e Bahia. Porém, no Brasil parece não existir uma apreciação, mas uma concepção que relaciona os cemitérios a algum aspecto negativo. Neste caso, as visitas limitam-se ao dia de finados e outras ocasiões esporádicas. A beleza das imagens e formas que adornam os jazigos são ignoradas, e os cemitérios tornam-se apenas um depósito de cadáveres.
Na segunda metade do século XIX, o imigrante europeu no Brasil possuía a necessidade de eternizar-se perante a sociedade e fazer do seu túmulo um símbolo de prosperidade junto aos seus compatriotas. Assim, os jazigos eram confeccionados por artistas trazidos da Europa especialmente para adornar a morada definitiva do colono. Em alguns cemitérios de São Paulo (principalmente o do Brás), os conjuntos de capelas refletiam a atmosfera doméstica do bairros italianos da cidade. Na verdade, a intenção das famílias imigrantes era fazer dos túmulos extensões do próprio lar. Os aspectos monumentais, ou humildes dos mausoléus representavam indiretamente a importância de determinadas famílias perante à sociedade da época.
O desenvolvimento da arte tumular no Brasil está intrinsecamente ligado à Europa. Porém, os cemitérios brasileiros apenas refletem as tendências das principais metrópoles européias, e se adaptam à disponibilidade material e cultural.
A chamada belle époque estende-se até 1890 na arte européia, onde os objetos requintados que enalteciam os túmulos eram produzidos artesanalmente. A partir deste momento, inicia-se aart noveau, período que marcou a produção de caráter industrial da estrutura arquitetônica e escultural dos jazigos. A utilização dos recursos mecânicos, ferramentas e novas técnicas da metalurgia e fundição propiciavam uma rentabilidade muito maior ao antigo artesão, e neste momento, operário. Os protótipos encarregavam-se de uniformizar os detalhes artísticos das esculturas e pilares que sustentavam os mausoléus, e agora apóiam também a produção serial dos artigos fúnebres. Assim, o custo foi reduzido e a sofisticação das obras de arte tumular foi democratizada. Mesmo as famílias mais pobres poderiam ter um jazigo ostentando uma certa nobreza.
Com o advento da produção mecânica, estabeleceu-se nitidamente também novas características que denunciavam os processos recém criados. A fundição fornecia portões e grades, cercaduras, cruzes e vigas metálicas, objetos pré-moldados etc. O escultor assume um papel de "autor intelectual", cabendo ao estatuário confeccionar as obras com ajuda de ferramentas elétricas e mecanismo que facilitavam a produção.
Houve também uma mudança significativa na transição entre os períodos da belle époque ao art noveau, que traduzia as novas intenções e a espiritualidade dos artistas. A simbologia escatológica (tradicional, e quase obrigatória) foi deixada de lado, tanto nas figuras individuais como num contexto na distribuição geral da alegoria. Em seu lugar, passaram a serem usadas imagens de um teor lírico porém realista. A figura do Anjo alado e assexuado, assume uma aparência humanizada, e a condição de personagem do cotidiano. Por vezes uma imagem infantil, outras vezes adolescente, torna-se um Anjo de procissão, acessível e impregnado de realismo; mas teatral e dramático quando preciso.
Outro ponto de sensível mudança na belle époque foi a inserção de alegorias simbolizando prosperidade, prestígio e fortuna. A presença de figuras pagãs, como Hermes (deus do comércio) ou mitológicas também são constantes.
A arte cemiterial brasileira teve sua ignição ao final do século XIX e início do XX. Nesse momento, foi reunida a disposição de famílias com recursos financeiros e a intenção de construir túmulos suntuosos a partir do trabalho de artistas famosos da Europa, principalmente os italianos. É nesse período que Brecheret produz suas peças modernistas nos cemitérios brasileiros. Emendabili, Oliani e Nicola Muniz denotam monumentalidade e sensualismo em sua esculturas. A presença do nu é considerada uma grande inovação. Todas as obras apresentam um riqueza extrema de detalhes, e uma leveza só atingida por artistas de expressão e talento elevados como os escultores que aqui aportaram.
No Brasil torna-se muito difícil encontrar uma linha cronológica evolutiva da arte cemiterial. Na verdade, não houve uma seqüência lógica, e sim um aglomerado de peças (algumas de procedência duvidosa) dispostas de forma aleatória nas necrópoles. A maioria dos cemitérios não acompanharam o crescimento populacional, e a organização tumular ficou comprometida. Outro fator que contribui para a degradação da arte cemiterial brasileira, é o estado lamentável de conservação das obras e das necrópoles num ponto de vista generalizado. Principalmente nos mais antigos, peças de inestimável valor histórico e artístico estão sendo destruídas pela ação do tempo e o vandalismo. O roubo de esculturas e objetos de bronze (para serem comercializadas ilegalmente) também cooperam para a perda irreparável destas obras que fazem parte do patrimônio artístico nacional. Atualmente, não existe uma produção voltada exclusivamente para a arte cemiterial. Poucos artistas dedicam-se a essa atividade, principalmente depois da criação dos "cemitérios-jardim", onde a presença do mausoléu, com sua grandeza e requinte, está praticamente extinta. Também devido ao alto custo das construções, já não existem famílias interessadas em sepultar seus mortos com a nobreza de outros tempos.



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Simbologia cemiterial


Além de monumentos tumulares de grande valor artístico, os cemitérios nos trazem uma complexa e abstrata simbologia através das formas geométricas, símbolos, objetos etc. A combinação destes elementos nas lápides, esculturas e mausoléus, cria mensagens que fazem alusão a conceitos religiosos da época, fornece informações sobre o falecido, sua origem familiar, nível social etc. Portanto, funcionam também como uma rica fonte de pesquisa sociológica e cultural.
De acordo com as palavras de um dos fundadores da Psicologia de Massa, Gustave Le Bon, temos explicação exata do significado das obras de arte nos túmulos:
"Não são os fatos em si que ferem a imaginação coletiva, mas sim o modo pelo qual se lhes apresentam. Os monumentos e as comemorações são, sem dúvida, os meios mais proveitosos, práticos e seguros, para gravar no espírito do povo as proezas de um herói, a grandeza de um nome ou a importância e o significado de um acontecimento".




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