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Figuras grotescas

sábado, 20 de fevereiro de 2010.

O termo grotesco – sob o qual são frequentemente englobadas tanto as quimeras (já pouco mais que decorativas, durante a Idade Média) como as gárgulas (exclusivamente aplicadas nas saídas de água) e ainda outras figuras monstruosas exibidas também no interior dos edifícios – só se generalizou durante o Romantismo.
É possível classificar estas figuras como sendo antropomórficas (aquelas em que é retratada a figura humana) ou zoomórficas (aquelas que representam animais), bem como detectar a sua evolução ao longo dos séculos.
Embora seja difícil datar com precisão quando muitas das gárgulas foram esculpidas, é fácil constatar que, gradualmente, começou a desenhar-se uma preferência por formas alongadas (com as mais recentes projetando-se para fora cerca de um metro em relação às paredes em que se apóiam). Nota-se igualmente, a partir do século XIII, uma maior tendência para retratar figuras humanas em vez de animais e também uma maior ênfase no detalhe. Mais tarde acentuam-se a sua fealdade e o seu caráter disforme e assustador, que acabará por se ir tornando menos demoníaco e mais caricatural, característica que haveria de conduzir à noção de grotesco, dado o exagero nas poses e expressões dos personagens. Verifica-se também que as temáticas vão sendo cada vez menos religiosas e mais mundanas. Contudo, continua por explicar a opção por este tipo tão peculiar de figuras, não existindo consenso a este respeito entre os que se dedicam ao estudo da arquitetura gótica européia.
Por exemplo, relativamente ao emprego das gárgulas durante a Idade Média, muitas das fontes que se debruçam sobre o tema começam por mencionar a própria designação de gárgula. Uns afirmam que a palavra que se refere ao gorgolejar da água quando passa através de um orifício; outros alvitram que provém do termo latino gorgulio, ou do francês gargouille, ambos significando garganta. Esta última tese tem ainda em seu apoio a Lenda de La Gargouille. Rezava uma história popular medieval que, no século VII, vivia na região de Paris, numa gruta próxima do Rio Sena, um dragão apelidado La Gargouille, com o hábito de sair do seu covil para engolir barcos e pessoas. Os aldeões locais viviam aterrorizados e todos os anos sacrificavam uma vítima ao dragão, numa tentativa de o apaziguar. O povo acabaria por ser salvo por um padre, que prometeu derrotar o dragão se aí fosse erguida uma igreja e se todos os habitantes concordassem em ser batizados. Após um combate decisivo o dragão foi derrotado e o padre arrastou o corpo do monstro para a aldeia, onde lhe lançou fogo. Porém, a cabeça e pescoço do dragão não arderam, pelo que acabaram por ser colocados numa parede da igreja.
Mas, para além desta lenda, que não esclarece muito em relação à exibição das gárgulas e quimeras nos edifícios medievais, particularmente os religiosos – sobretudo se tivermos presente que, de início, muitas destas figuras eram de inspiração pagã e pré-cristã – há outras tentativas de explicação para este fenômeno.
Alguns investigadores defendem a idéia de que, tal como na Antiguidade, a função destes seres grotescos era a de protetores. O seu aspecto assustador teria como finalidade manter à distância dos edifícios (e daquilo que continham) as forças do mal e os seus emissários, nomeadamente o Demônio e seus algozes. Outra idéia, talvez algo inesperado, é a de que as carrancas não pretenderiam assustar, mas seriam sim uma expressão aterrorizada das próprias figuras após terem presenciado algo de sinistro. Outra idéia ainda, e que goza de bastante aceitação, é a de que, numa época em que poucos sabiam ler, era importante ensinar ao povo, recorrendo às imagens, os preceitos cristãos, nomeadamente dando-lhes a conhecer aquilo a que ficavam sujeitos aqueles que se desviassem dos caminhos da verdadeira fé (note-se que, nessa época, as deformidades físicas eram tomadas como castigos divinos por pecados praticados, ou como provas de que aqueles que delas padeciam tinham pactuado com as forças das trevas – uma justificação adicional para o aspecto grotesco e exagerado de algumas representações). Contudo, esta tese tem também pontos fracos: um deles é o fato de os grotescos surgirem igualmente em edifícios laicos e em casas particulares; um outro é o de as imagens não estarem de acordo com o padrão comum às restantes representações religiosas típicas do período em questão. No entanto, parece haver, por exemplo, uma relação simbólica entre os sete pecados mortais e alguns dos animais representados – orgulho/leão, inveja/serpente, ira/javali, preguiça/burro, ganância/lobo, gula/urso e luxúria/porco –, pelo que a sua observação freqüente poderia levar os fiéis a refletirem sobre as respectivas condutas.
Por fim, há também quem seja de opinião de que é pouco provável que se consigam extrair ensinamentos com significado religioso de muitas das figuras, nomeadamente daquelas que são antropomórficas, realizadas já durante a fase final do período gótico. Nestas sobressaem sobretudo as caretas e posturas corporais mais ridículas e menos assustadoras, motivo pelo qual se julga que poderiam ser uma forma de chacota relativa à personagens locais, de crítica social ou dos costumes da época.
Outra peculiaridade que tem intrigado os estudiosos é a questão de, estando as gárgulas e quimeras habitualmente colocadas num plano bastante elevado e em recantos por vezes quase invisíveis a partir do solo, por que é que foram esculpidas com tão grande preocupação e riqueza de detalhes? Uma das explicações avançadas refere que, sendo estas esculturas realizadas para glorificar o Senhor, como, de resto, todas as catedrais góticas, e estando, para além disso, colocadas tão alto (e assim mais próximas dos Céus), Deus poderia mais facilmente aperceber-se da perfeição do trabalho feito.
Enfim, muito mais poderia ser dito acerca destas curiosas figuras, nomeadamente no que diz respeito a numerosas personagens que surgem repetidamente, e cujo estudo aprofundado revela influências das mais variadas origens, quer geográficas, quer culturais. Certo é que, embora tenham perdido a carga simbólica que tiveram outrora, ainda hoje mantêm o seu fascínio, continuando a ser aplicadas como ornamento em várias construções, e não deixa de ser empolgante para muitos tentarem decifrar os mistérios que parecem obstinadamente encobertos...
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Gárgulas


Crê-se que as chamadas gárgulas, figuras por vezes igualmente quiméricas, começaram por ser aplicadas para embelezar os orifícios por onde as águas escorriam dos telhados para o chão.
Sabe-se que já em algumas edificações gregas, ao longo dos rebordos dos telhados inclinados,nas extremidades destes e, eventualmente, também ao longo das paredes, existiam pequenas caleiras para recolha da água das chuvas, que era canalizada para orifícios por onde se escoava. Em alguns casos, a água era conduzida para baixo por uma conduta, cuja extremidade inferior encaixava por detrás da escultura de uma cabeça de leão, de modo que a boca jorrasse a água para longe (mais uma vez a figura do leão surge como protetora não só contra os inimigos terrenos, como contra espíritos malignos).
Mas seria sobretudo na época medieval, mais precisamente no período entre os séculos XII e XV, a partir da construção das grandes catedrais góticas, que as gárgulas viriam a popularizar-se na Europa Ocidental, principalmente na França, embora também na Inglaterra e, em menor escala, em outros países. Porém, nessa altura, as temáticas representadas tinham já recebido influências de outros povos e culturas, como os Celtas e os Normandos, muito embora sob o olhar atento da Igreja de Roma.
Segundo parece, as gárgulas começaram por ser peças em madeira ou cerâmica. Porém, só após se ter generalizado o uso da pedra para essa finalidade (sobretudo o calcário ou o mármore, embora tenham também existido esculturas em terracota, que não chegaram aos nossos dias) é que surgiu a possibilidade de passar a esculpir as figuras com maior riqueza de pormenor. São igualmente conhecidos alguns exemplos, relativamente raros, feitos em metal.
Quando nos referimos às gárgulas, talvez nos venha à mente as numerosas criaturas grotescas que podemos encontrar na catedral parisiense de Notre-Dame – incontornável exemplo clássico, inspirador de histórias que incluíam personagens como Quasímodo, o famoso corcunda, criado pelo romancista francês Victor Hugo.
Tal como sucedia nas construções gregas, um dos motivos mais correntemente apontados para a utilização das gárgulas refere a necessidade, em termos de conservação das obras arquitetônicas, de fazer com que a água das chuvas que se abatiam sobre os edifícios fosse captada após escorrer pelas paredes, conduzida por caleiras que separavam essas escorrências em várias direções, e levando a que fossem projetadas para longe das paredes e fundações no exterior das construções, evitando assim que se infiltrassem no solo junto aos alicerces, onde acabariam por dissolver as argamassas e arruinar as alvenarias, ou que desgastassem as pedras exteriores, trazendo perigo à estabilidade da construção.
Para que essas tão necessárias goteiras, que seriam protuberâncias inestéticas destacadas visivelmente nas esquinas, não destoassem no conjunto harmônico de toda a edificação, teria então surgido a hipótese de as ornamentar com esculturas. Porém, pelo menos de início, isso só acontecia nos edifícios de maior porte ou nas construções pertencentes aos mais abastados, já que se tratava de um tipo de trabalho bastante caro para a época – à semelhança do que ocorria com outras figuras no interior dos templos, as gárgulas também eram ricamente pintadas e algumas chegavam a receber ornamentos dourados.


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Quimeras


Remontam, pelo menos, à Antiguidade Clássica os exemplos de várias figuras mitológicas, muitas vezes deuses ou semideuses, que retratavam entes híbridos, ou seja, uma combinação de outros seres, os quais eram dotados de determinados atributos ou simbolizavam qualidades específicas.
Por exemplo, são sobejamente conhecidas as esfinges egípcias, figuras enigmáticas com cabeça humana e corpo de leão; entre os Assírios encontramos os touros alados (corpo de touro, com asas e cabeça humana); um motivo tipicamente persa era o leão com asas e cornos de bode; entre os Hebreus podemos encontrar os querubins (esfinges aladas que surgem abrigando sob as asas a Arca da Aliança, no Templo de Salomão); os antigos Gregos nutriam especial predileção pela Quimera, uma criatura com cabeça de leão (símbolo do poderio helênico) que exalava fogo pela boca, tinha o corpo de uma cabra e cauda de serpente – essa designação acabou por ser adotada para designar genericamente outros tipos de seres fantásticos, cujos corpos eram a combinação de dois ou mais animais conhecidos. Assim, e ainda na mitologia grega, surgem, entre outros, as hárpias (que tinham cabeça e torso de mulher, pernas e cauda de ave e também asas), os sátiros – cujos equivalentes romanos eram os faunos – (com torso humano, cabeça com cornos, e a metade inferior do corpo semelhante à de um bode), os centauros (parte homens, parte cavalos) ou os grifos (com cabeça, bico, asas, torso e patas dianteiras semelhantes às de uma águia, mas com orelhas, quartos traseiros e cauda de leão), os quais podemos igualmente encontrar entre os Persas.
Enfim, são numerosas, embora muitas vezes baseadas em idênticos temas, as imagens que reuniam as características destas figuras híbridas e que foram adotadas por diferentes povos, sendo quase certo as mais antigas terem influenciado as seguintes, mesmo em espaços geográficos relativamente distantes.
Mas qual era a função de tais imagens? Uma das explicações que parece reunir maior consenso é a de que serviriam como "guardiãs", protegendo das influências maléficas os locais onde estavam implantadas.
Uma vez que, em vários casos, estas quimeras antigas representavam divindades ou heróis míticos com poderes sobre-humanos, esse papel protetor sobressai assim como um motivo plausível para que tenham sido retratadas das mais diversas formas: em pequenos artefatos, em jóias ou amuletos, em recipientes e escudos, quer pintadas, quer esculpidas, surgindo tanto em templos como em edifícios laicos e até mesmo em casas particulares.

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O Mistério das Catedrais – Cap. III


Alguns pretenderam erradamente que provinha dos Godos, antigo povo da Germania; outros julgaram que se chamava assim a esta forma de arte, cujas originalidade e extrema singularidade provocam escândalo nos séculos XVII e XVIII, por zombaria, atribuindo-lhe o sentido de bárbaro: tal é a opinião da Escola Clássica, imbuída dos princípios decadentes do Renascimento.
A verdade, que sai da boca do povo, no entanto, manteve e conservou a expressão Arte Gótica, apesar dos esforços da Academia para substituí-la por Arte Ogival. Há ai uma razão obscura que deveria obrigar a refletir os nossos lingüistas, sempre à espreita das etimologias. Qual a razão por que tão poucos lexicólogos acertaram? Simplesmente porque a explicação deve ser antes procurada na origem cabalística da palavra, mais do que na sua raiz literal.
Alguns autores perspicazes e menos superficiais, espantados pela semelhança que existe entre gótico e goético pensaram que devia haver uma estreita relação entre a arte gótica e a arte goética ou mágica.
Para nós, arte gótica é apenas uma deformação ortográfica da palavra argótica cuja homofonia é perfeita, de acordo com a lei fonética que rege, em todas as línguas, sem ter em conta a ortografia, a cabala tradicional. A catedral é uma obra de art goth ou de argot. Ora, os dicionários definem o argot como sendo uma linguagem particular a todos os indivíduos que tem interesse em comunicar os seus pensamentos sem serem compreendidos pelos os que o rodeiam. É, pois, uma cabala falada. Os argotiers, os que utilizam essa linguagem, são descendentes herméticos dos argo-nautas, que viajavam no navio Argo, falavam a língua argótica – a nossalíngua verde – navegando em direção as margens afortunadas de Colcos para conquistarem o famoso Tosão de Ouro. Ainda hoje se diz de um homem inteligente mas também muito astuto: "ele sabe tudo, entende o argot". Todos os Iniciados se exprimiam em argot, tanto os vagabundos da Corte dos Milagres – com o poeta Villon à cabeça – como os Frimasons ou franco-mações da Idade Média, hospedeiros do bom Deus, que edificaram as obras-primas góticas que hoje admiramos. Eles próprios, estes Nautas construtores, conheciam a rota do Jardim da Hespérides...
Ainda nos nossos dias os humildes, os miseráveis, os desprezados, os insubmissos, ávidos de liberdade e de independência, os proscritos, os errantes e os nômades falam argot, esse dialeto maldito, banido da alta sociedade, dos nobres que o são tão pouco, dos burgueses satisfeitos e bem pensantes, espojados no arminho da sua ignorância e da sua presunção. O argot permanece a linguagem de uma minoria de indivíduos vivendo à margem das leis estabelecidas, das convenções, dos hábitos, do protocolo, aos quais se aplica o epíteto de vadios, ou seja, de videntes e, mais expressivo ainda, de Filhos ou Descendentes do Sol. A arte gótica é, com efeito, a art got ou cot, a arte da Luz ou do Espírito.
Pensar-se-á que são apenas simples jogos de palavras. E nós concordamos de boa vontade. O essencial é que guiem a nossa fé para uma certeza, para a verdade positiva e científica, chave do mistério religioso, e que não a mantenham errante no labirinto caprichoso da imaginação. Aqui em baixo não existe acaso, nem coincidência, nem relação fortuita; tudo está previsto, ordenado, regulado e não nos pertence modificar a nosso bel-prazer a vontade imperscrutável do Destino. Se o sentido usual das palavras nos não permite qualquer descoberta capaz de nos elevar, de nos instruir, de nos aproximar de Criador, o vocabulário torna-se inútil. O verbo, que assegura ao homem a incontestável superioridade, a soberania que ele possui sobre tudo o que vive, perde a sua nobreza, a sua grandeza, a sua beleza e não é mais do que uma aflitiva vaidade. Ora, a língua, instrumento, do espírito, vive por ela própria, embora não seja mais do que o reflexo da Idéia universal. Nada inventamos, nada criamos. Tudo existe em tudo. O nosso microcosmos é apenas uma partícula ínfima, animada, pensante, mais ou menos imperfeita, do macrocosmos. O que nós julgamos descobrir apenas pelo esforço da nossa inteligência existe já em qualquer parte. É a fé que nos faz pressentir o que existe; é a revelação que nos dá a prova absoluta. Muitas vezes passamos ao lado do fenômeno, até mesmo do milagre, sem dar por ele, cegos e surdos. Quantas maravilhas, quantas coisas insuspeitadas descobriríamos se soubéssemos dissecar as palavras, quebrar-lhes a casca e libertar a o espírito, divina luz que eles encerram! Jesus exprimia-se apenas por parábolas; poderemos nos negar a verdade que elas ensinam? E, na conversação corrente, não serão os equívocos, os pouco mais ou menos, os trocadilhos ou assonâncias que caracterizam as pessoas de espírito, felizes por escaparem à tirania da letra e mostrando-se, à sua maneira, cabalistas sem o saberem?
Acrescentemos, por fim, que o argot é uma das forças derivadas da Língua dos Pássaros, mãe e decana de todas as outras, a língua dos filósofos e dos diplomatas. É o conhecimento dela que Jesus revela aos seus apóstolos, enviando-lhes o seu espírito, o Espírito Santo.
É ela que ensina o mistério das coisas e desvenda as verdades mais recônditas. Os antigos Incas chamavam-na Língua da Corte porque era familiar aos diplomatas, a quem fornecia a chave de uma dupla ciência: a ciência sagrada e a ciência profana. Na Idade Média, qualificavam-na antes da edificação da torre de Babel, causa da perversão e, para a maioria, do esquecimento total desse idioma sagrado. Hoje, fora do argot, encontramos as suas características nalgumas línguas locais como o picardo, o provençal, etc. e no dialeto dos ciganos.
A mitologia pretende que o célebre adivinho Tirésias tenha possuído perfeito conhecimento da Língua dos Pássaros, que Minerva lhe teria ensinado, como deusa da Sabedoria. Ele partilhava-a, diz-se, com Tales de Mileto, Melampus e Apolônio de Tiana, personagens fictícios cujos nomes falam eloqüentemente na ciência que nos ocupa e bastante claramente para que tenhamos necessidade de os analisar nestas páginas.

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Origem do termo Gótico


Segundo a versão mais difundida, o termo "gótico" deriva de Godos, o povo germânico que habitava a Escandinávia. Porém, em sua obra O Mistério das Catedrais, Fulcanelli nos apresenta uma outra versão. A palavra "gótico" seria uma deformação fonética de Argoth (ou Art Goth), uma linguagem restrita utilizada somente por Iniciados em Ocultismo. Embora historicamente essa versão seja incoerente, é uma visão interessante de um grande alquimista.
Confira o trecho do livro que disserta sobre essa possibilidade:

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